Ser brasileiro na chegada ao Reino Unido já é suficiente para despertar a desconfiança do funcionário da imigração no aeroporto. Um relatório oficial do serviço de imigração aponta que algumas nacionalidades, incluindo a brasileira, despertam mais dúvidas sobre autenticidade de documentos e razões verdadeiras do motivo da viagem.
O relatório, referente ao ano 2002, indica que o Brasil teve 2.400 entradas recusadas (1,8% de todos os brasileiros que tentaram entrar no país), colocando o país em quinto na lista, atrás de Jamaica (9,1% de recusas), Lituânia (7,5%), Zimbabue (4,1%) e Letônia (3,5%). E, de acordo com o documento, desde julho de 2003 os oficiais da imigração estão autorizados a examinar mais detalhadamente os recém-chegados de algumas nacionalidades, usando como base a seguinte conta: se uma determinada nacionalidade tem 50 casos mensais de recusas ou entrevistas mais longas e se cinco de cada mil aceitos no país são desse determinado país.
O relatório indica também que o terminal 3 do aeroporto de Heathrow é a entrada do país onde há mais recusas e mais problemas com pessoas tentando se passar por estudantes e usando nomes de escolas não confiáveis. Em Heathrow, diz o documento, as nacionalidades com maior número de entradas recusadas em 2002 foram Malásia, Brasil e África do Sul.
Mary Coussey, autora do relatório, analisou 83 casos de entradas recusadas. Destes, 21 casos de brasileiros, 18 da Polônia, 7 sul-africanos, 3 lituanos, 3 bolivianos, 3 da Malásia e 2 de outros países. A maioria, aponta, eram jovens e 75% do sexo masculino.
Ela aponta alguns exemplos:
- Um brasileiro tentou entrar como turista dizendo que ia ficar por oito dias. Disse que vinha para ver o Carnaval de Notting Hill, mas não soube dizer o que era e nem onde. Não soube dizer sequer que outros lugares gostaria de visitar em Londres. Salário mensal não condizia com o que ele disse que gastou com a viagem. Tinha documentos sobre trabalho em Portugal. O funcionário negou sua entrada por não acreditar que vinha para turismo.
- Outro brasileiro, profissão fazendeiro. Reserva de hotel para duas noites em Birmingham, disse que visitaria Londres por uma semana. Sem nenhuma idéia de pontos turísticos na cidade, gastou o equivalente a um ano de salário para pagar a viagem.
Passageiros que tentam entrar como estudantes são apontados como casos regulares de recusa.
Um brasileiro disse que estava matriculado em uma escola de inglês no centro da cidade, mas a escola estava na lista do Home Office indicada por falsificar índice de presença para alunos. Ele tinha pouca idéia sobre a escola, pela qual tinha pago o equivalente a mais de um ano de salário. A imigração não acreditou que ele era estudante.
Mas o relatório diz que a maioria das recusas parece ser justificada. Muitos casos acontecem porque a pessoa que está chegando e o contato no Reino Unido acabam se contradizendo na razão da viagem. Alguns não sabem dizer quanto tempo vão ficar. E se o passageiro é da lista de países "suspeitos" acaba perdendo o que chamam de benefício da dúvida e passam por entrevistas e checagem mais longas.
Uma das características que mais levantam suspeitas dos oficiais de imigração é quanto ao dinheiro que a pessoa está trazendo e gastando com a viagem. Neste item, o relatório destaca: "Eu vi casos de certos países da América do Sul, principalmente do Brasil, que a entrada foi recusada não porque a pessoa tinha pouco dinheiro, mas sim por ter dinheiro demais e não saber explicar por que trazia uma quantia tão grande. Por exemplo, uma brasileira com reserva de hotel, passagem de volta e criança em casa teve a entrada recusada como turista. A dúvida foi porque ela trazia 500 dólares em dinheiro para passear mas não soube dizer o nome de um lugar que ela gostaria de visitar."
O relatório indica que determinadas nacionalidades preferem tentar entrar por determinados aeroportos ou portos. Brasileiros são apontados por serem os mais recusados em Gatwick, Heathrow (Terminais 2 e 4), Paris e Waterloo. E mais de 67% de entradas recusadas apenas em dezembro de 2003, no London City Airport, eram de brasileiros. "Quando perguntei por que o número tão alto naquele aeroporto, a justificativa foi que muitos da América do Sul acreditam que é mais fácil entrar no Reino Unido vindo de outro país da Europa."
Mary Coussey diz no relatório que passageiros do Brasil são alvos de checagem mais detalhada no que diz respeito ao dinheiro porque são de um país economicamente pobre, com salários mais baixos, trabalham geralmente com agricultura e vêm dizendo que são turistas por alguns dias ou duas semanas, geralmente chegam sem reserva de hotel ou reserva para apenas uma noite, pouco ou nenhum conhecimento de locais que gostariam de visitar, não têm guias. Um outro tipo de passageiro que dificilmente convence na imigração é aquele com baixo salário e que viaja com uma quantia muito grande de dinheiro (geralmente mais da metade de um ano de salário) e não sabe explicar como obteve aquela quantia para a viagem.
No relatório, Coussey elogia a atitude profissional da maioria dos oficiais de imigração, mas também aponta que alguns funcionários às vezes fazem “comentários pejorativos” sobre passageiros de certas nacionalidades.
Os números referentes a 2003 ainda não foram divulgados, mas a expectativa apontada por Coussey no relatório é que as mesmas nacionalidades (incluindo Polônia, que ainda não fazia parte da União Européia) terão um crescimento no índice de entradas recusadas no país.
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